6 de dezembro de 2011

Tenha fé e será atendido!


Ana Beatriz, que era louquíssima de dar nó por Gerson, o queria só e somente só para si. Que ele fosse seu e que seus fossem seu amor e seu destino. Que ela fosse a única dona de seu coração, a mãe dos seus filhos, sua companheira para sempre, todo o sempre. Que nunca fosse trocada por ninguém.
Com a herança do pai seqüestrou um neurocirurgião cubano e dois engenheiros russos e os trancou num calabouço até que eles desenvolvessem o microchip que lhe possibilitasse realizar seu sonho.
Onze meses e vinte e três dias depois, lá pelas nove da manhã, Ana Beatriz recebeu a ligação com a resposta tão, tão esperada, sonhada, idealizada e agora, realizada: sim! O microchip estava pronto.
Gerson foi encapuzado em uma esquina, colocado em uma van, adormecido com éter, levado ao calabouço e teve o microchip implantado na pele do dedão do pé (esquerdo, a única exigência dos sequestrados). 
Para as mulheres com quem Gerson sai casualmente, mesmo que o casualmente seja por semanas, tudo fica no casualmente. Quando evolui para meses, como é o caso da Carlinha e da Deisinha, sete e dez meses respectivamente, ou como no caso da Lu, sua secretária, e da Pati, sua prima, dois e cinco anos, não necessariamente nesta ordem, ele é claro e taxativo: Ana  Beatriz é seu amor, a única mulher da sua vida, a mãe de seus filhos, sua companheira e que não a trocará por ninguém. Nunca.

19 de outubro de 2011

Domingo de chuva, 9 de setembro...*

Abri teu envelope com tanta ansiedade que quase rasguei tua carta. Linda! A li de forma brusca, a deglutindo como uma cobra a um sapo. Ou quem sabe um sapo a uma mosca? Saber que tua vida segue bem me deixa feliz e ao mesmo tempo angustiada. Talvez insegura por não fazer parte para o primordial de um dia perfeito. A Virgínia tá linda. Tem mais um botão lilás nascendo, e os ninhos continuam caindo, agora menos pelo início da primavera. Ainda sinto teu gosto no suco de laranja com leite. Contra tua vontade cortei os cabelos, daquele jeito que eu queria, curto atras, na nuca e comprido nos ombros. Talvez seja minha forma de vingança por teres escolhido viver longe de mim, nessa loucura toda que te faz tão bem, eu sei, claro.
Ainda fumo um antes do banho e ouço teu CD predileto, mais por costume que por necessidade de lembranças tuas já que você está incrustado até no maldito tapete que ainda sofro tentando mantê-lo limpo, claro também que não me desfaço dele por pura teimosia, assim, longe eu admito. E na geladeira, sempre que a porta não fecha quando tem muito gelo, eu lembro de ti. Não quero dizer que só a desordem me lembra você, não é isso. A ordem chata com que eu mantenho meus livros (1º letra do ultimo sobrenome do autor) é lembrança sua. Meus traumas dissipados e a nova capacidade de viver o mundo de forma mais corajosa também. E manda dizer pra essa tal Maria Lúcia que ela não ouse atender o telefone quando eu tiver coragem pra ouvir tua voz novamente, e se eu souber que você a chama de baby você tá frito!! Eu te mato!! E manda uma carta pra tua mãe, ela tá preocupada. No meu aniversário ela me trouxe um Vinícius de Moraes com uma dedicatória que é a cara dela "pra você continuar amando".
É isso.
Ao brincos são lindos, mas claro, não esperei que vc lembrasse, eu tenho alergia a certos materiais, tudo bem. A foto eu tirei um dia antes de cortar os cabelos. Claro que eu tava chapada, vê-se pelos olhos, né? Foi na praia do amor.
Beijos.

PS.: Na próxima eu te conto quem foi que tirou a foto e porque eu estou com esta expressão de "foi bom" estampada no rosto. Aguardo ansiosamente por notícias suas.

Beijos.
Baby.





Meu em 2001.




Primeiro texto publicado, de quando este blog era tímido/covarde e ainda não tinha espaço para comentários ...


*No título original, fica Domingo de chuva, 9 de setembro de 2001.

23 de agosto de 2011

À procura da felicidade

Ela adorava ler as revistas de dois anos trás compradas no sebo. Sabia tudo sobre as celebridades. Os produtos para celulite, maquiagens, férias luxuosas, traições, lançamentos de produtos e tudo o mais que fosse inalcançável para ela. Lancôme, MAC, Ilha de Caras, separações, tudo isso era muito mais interessante do que sua vida de geladeira vazia, noites em filas de hospital seguidas de dias mendigando para a compra do remédio. 
Depois de não ter dinheiro para enterrar o filho, decidiu que isto tinha que acabar. Trocou sua geladeira velha por uma TV tão mais ou quanto e passou a viver das imagens da vida alheia, das personagens com finais pre-definidos cujos atores dariam vidas a outros na próxima novela das seis, das alegrias de Ipanema, de imitar os sotaques nordestinos, de dar bom dia à Ana Maria Braga.


Hoje ela vive nas ruas chamando mendigos para cheirarem seus cabelos lavados com Kerástase, ensina receitas às senhoras nas paradas de ônibus, canta temas de novelas, recomenda que velhinhos procurem o Boston Medical, explica para as mocinhas que não se combina mais sapatos com bolsa e sorri feliz, sem saber seu nome, sua idade, sua (triste) história.

20 de agosto de 2011

Diálogos horríveis III

Conversas entre 1 e 2. 
1 é minha prima de quatro anos. 2, a pessoa que vos escreve...

Primeiro ato

1 - Eu não gosto de criança morta toda ensanguentada...
2 - !
1 - Tu gosta?
2 - !?!?
1 - Tu queria ver tua filha morta toda ensanguentada?
2 - ??!!

Segundo ato
(Brincando de casinha)

1 - MARIDO!!!! Acorda e vai já trabalhar!! (aos gritos, claro...)
2 - Paloma, fala com carinho com o marido. Trata ele com carinho...
1 - Não porque ele é muito chato!
2 - E porque tu não separa dele?
1 - Porque a gente só tem uma casa pra morar, daí a gente tem que morar junto...
(Silêncio...)
2 - E os filhos de vocês?
1 - "Morrero" atropelado!!
2 - =O

Juro que foi assim, com todas as vírgulas...

1 de agosto de 2011

Descabelada e Assanhada...



Deixo a tua cama com a cara e os cabelos assanhados, correndo (maldita trepadinha da manhã pra atrasar para o trabalho) para uma chuveirada rápida.

- que tipo de homem não tem um pente em casa?
- do tipo que não penteia o cabelo!!!

Te beijo apressada.
Enquanto atravesso a rua, com a bunda ainda ardendo pelo último tapa, as pernas ainda trêmulas, tentando me equilibrar no salto, os cabelos ainda assanhados, penso quando (ou se) você vai me ligar novamente.
E a bolsa começa a vibrar, vasculho nervosa (porque mulher carrega tanta coisa?) e... Decepção.
Não é você...

- Oi, amor!

27 de maio de 2011

O enterro dos fantasmas...



Aquelas manhãs ouvindo a Rádio Novo e Velho Aeon no ônibus estavam acabando com ela. Nem pelo ônibus, mas porque a cada música um fantasma se levantava para tentar mais uma DR, mais um beijo, mais uma assombração. Ela cansou. Telefonou para o trabalho alegando doença, ligou o som e esperou.
Tocou Legião Urbana e ele chegou ainda nos primeiros acordes, com os cabelos longos e negros, olhos negros e tristes, chantagistas e condenadores.
Se acusaram em silêncio.
Renato Russo pegou o violão para Angra dos Reis e ela disse que não. Que não, que tudo menos isto. Nada sobre não só sentir saudades (sempre algo mais) ou seu coração perfeito batendo à toa (isso dói). Renato cantou 20, vinte e nove, ela deu um sorriso amarelo com o canto da boca, conversaram e ele tentou abraçá-la enquanto ela prendia a respiração para nunca mais sentir o cheiro dele – melhor evitar.
Se despediram para nunca mais com Hoje não dá.

Tocou I Love You Baby (Can't take my eyes off of you…): o fantasma mais vivo, mais fantasma. Ele tentou argumentar, mas ela teve a certeza de que ele morreria (mais e novamente) logo, logo...

Começou Lobão e ela o chamou
- Eu? Porque eu com Lobão?
Sei lá, ela disse. Sempre lembro de ti. Desde o dia em q tu me deu aquele beijo, com meio metro de língua e saiu desconsertado me pedindo desculpas, sempre lembro. Principalmente aquela você está me convidando, menina quer brincar de amar.
- Mas tu nunca me convidou!
- Será q é pq eu tinha 14 anos e tu 25?
- ...
E corações psicodélicos também (ainda me lembro daquele beijo, spank punk violento
iluminando o céu cinzento, eu quero você inteira
). Queria tanto que tu quisesse...
- Eu sei, benzinho
-Mas não rola, né? Eu sei...
E ele se foi...

Com Cramberries ela nem se levantou e ele teve o descaramento de aparecer, jurando que ainda era fantasma...

Ela ficou lá, sentadinha ao lado do Zeca Baleiro quando ele chegou já no final da música, com os olhos chapadíssimos cantando sempre que te vejo assim, linda, nua e um pouco nervosa enquanto Zeca cantava Bola Dividida e ela o olhou surpresa:
- Tá fazendo que aqui??
- Vim mandar essa cambada embora.
A abraçava repetindo minha, minha, minha, minha...
Chamou Tom Jobim pra cantar Minha Namorada (não que ele soubesse a letra...).