9 de agosto de 2013

A Novidade era o Máximo do Paradoxo

. Esse texto foi inspirado na música  A Novidade , do Gilberto Gil. 


Padre Eduardo praticamente nasceu padre. Nunca quis ser outra coisa, até o dia em que morreu. Seu Darcy nem sabe como virou dono de puteiro, foi um negócio que tava na família há quatro gerações, ele era o único filho homem. Nanda Suely virou puta aos poucos, uma concessão aqui, uma troca de favores ali e resolveu levar a coisa a sério. Foi esse improvável triângulo não amoroso que movimentou aquelas semanas no bairro São Gilberto. Padre Eduardo era conhecido na região por uma igreja que tinha santos com cara de gente, com cara de povo, sabe? Sem cara de coitados ou superiores, cara de gente comum, que um dia recebeu um chamado divino, só isso. E lá estava Padre Eduardo, a caminho de uma reunião de jovens desencaminhados quando viu a mulher que seria o rosto do povo para sua Nossa Senhora. Já viu tudo, né? Comentou com o amigo, ele não vê a tal mulher.
-  aquela ali na praia, ali na areia
-  Nanda Suely? Nanda Suely é o melhor boquete desta cidade, tá maluco?
Sim, até padres tem amigos tarados, e, não, ele não estava maluco! O desafio era ainda maior e a vitória seria ainda melhor...
Bom, vou poupar vocês dos pormenores...
Dias posando para Padre Eduardo, conversas sobre vocação, pecado, céu, inferno, Nanda Suely começa a admirar a igreja, Padre Eduardo a entender que é só uma profissão.
Mas seu Darcy, coitado... Precisou contratar cinco novas garotas para sobreviver ao concorrido mercado da sacanagem, mas sua casa nunca mais foi a mesma, nunca mais se formaram filas, casa cheia, nada. Os clientes começaram a se queixar de Nanda Suely. Sua profissional mais requisitada não era desejada por ninguém. Diziam que se sentiam sujos. Sujos, pecadores, indignos de voltarem à suas esposas, seus lares, a beijarem seus filhos. Não se pode dar o pau pra uma mulher com cara de santa chupar.
Padre Eduardo, na inauguração de sua Nossa Senhora fora vaiado, apedrejado, expulso da cidade e da congregação. Saiu até no jornal. 

Um comentário:

Anônimo disse...

Oh, Pô! Que coisa linda. Análise antropológica profunda. É bem assim. Existe as mulheres com cara de santa pra casar e as com cara de puta para comer. Nunca se pode misturar as duas coisas, são de ordem muito diferentes. Puta hipocrisia.